É extenuante não perceber o que ainda faço aqui.
É cansativo sair e caminhar por esta cidade já tão vista e vivida por mim, ir aos mesmos cafés, sentar-me nas mesmas cadeiras e ver as mesmas pessoas constantemente lá sentadas.
Vejo os bêbedos do Café do Ernesto a jogarem às cartas, as velhotas a maldizer no Samambaia, os jovens adultos a conspirar no Coala, os decadentes de meia-idade no Café do Zé a tentarem aproveitar aquilo que ainda lhes resta e lhes dá prazer, as miúdas oferecidas e os rapazes presunçosos a mostrarem-se à sociedade no Algodeia, os alternativos e os “miúdos da cena” a falarem de música no Pessoa…
Vejo esta gente pergunto-me onde me levará a vida? Onde estaremos nós, eu e os meus amigos e as pessoas que observo agora? O mais provável é que venhamos a substituir os habituais frequentadores do Ernesto ou do Zé… Vamos estar nas esplanadas da cidade onde tantos dos nossos sonhos e planos foram gritados aos quatro ventos, e vamos beber e fumar e jogar às cartas como se não houvesse amanhã… Porque, afinal, haverá amanhã para àqueles pobres diabos?
O que os espera? Alguns têm uma casa onde moram sozinhos por não ter quem lhes faça companhia, outros têm mulheres que já não suportam e que não os compreendem, outros têm filhos que os ignoram ou os exploram… Todos eles têm um grande nada à sua espera. Um nada feito de sonhos desfeitos, de tentativas falhadas, de ambições frustradas, oportunidades que não foram aproveitadas ou que tiveram um mau resultado…
No seu futuro já não existem arqueólogos destemidos, políticos cativantes, psicólogos empreendedores, escritores laureados, advogados imbatíveis, humanitários dedicados, realizadores galardoados… Apenas existem passageiros que perderam o comboio para a Terra-da-Auto-Realização e que já não conhecem mais nenhum prazer para além de uma fresca e revigorante cerveja, de um reconfortante e quente cigarro, de um simples e infantil jogo…
Eu ainda acredito! Mesmo que tudo não passe de uma ilusão absurda, acredito que conseguiremos participar na viagem de onde tantos saíram a meio, desencantados e desalmados.
Eu ainda tenho o futuro…. Ele arde dentro de mim fazendo-me ficar febril de tanto desejo de ir mais além.
Por isso pergunto à noite, quando acordo quase todas as madrugadas às quatro horas e me sento de súbito na cama “O que é que ainda faço aqui?”.
É cansativo dormir quando se sonha de mais.
É extenuante ter insónias quando se pensa demasiado.
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