terça-feira, 27 de março de 2012

A Falésia

Atiro fora os lençóis sujos de nós. 
Atiro-os para o saco da roupa para lavar como atirámos para longe tudo o que fomos. Atiro o teu cheiro para o esquecimento, pois é onde tem de pertencer. Atiramos tudo fora para atirar ainda mais longe a dor. 
Atiro-me a mim, àquilo que fiz por ti, aquilo que mudei contigo, às memórias ferverosas, às noites longas, a tudo atiro como às lágrimas e aos gritos, pequenas pedras pela falésia. 
E Atiro-te a ti, à tua bondade, à tua insistência, aos teus sonhos inúteis e desperdiçados, grandes pedras a mergulhar nas ondas. 
Para ali atiro este depósito intensionalmente irrecuperável, para que lá em baixo se enterre na areia a nossa mágoa e para que penetre no subsolo fundamente à medida que abandona as nossas mentes, a tua mente... 
Atiro fora o teu amor, que nunca soube usar, na esperança que alguém o encontre por entre a maré baixa. 
Atiramos tudo. Atiramo-nos um ao outro. Atiramos a vida.