Tratava-se de uma daquelas tardes silenciosas
Daqueles sábados terrivelmente fastidiosos.
Mas, para aquelas duas pessoas,
Estas eram horas terrivelmente maravilhosas
Pelas quais ambos estavam sempre ansiosos.
Em lado algum daquela casa se via luz,
Excepto na ténue chama dançante
Da vela branca que ardia sem parar.
E aquele clarão amarelo, que os seduz,
Iluminava aquele serão triunfante.
Numa enorme banheira de metal,
Com possantes pés também metálicos,
Se davam aquelas conversas boas
Que fortaleciam aquela relação fenomenal
Com os seus fantásticos temas alquímicos.
Juntos, o filho pequeno e sua mãe,
Se banhavam sempre conversando.
O menino, sem nunca parar de a amar,
Ouvindo quantas virtudes ela tem
Para lhe ensinar, ficava desfrutando
Das histórias que ela tinha para contar,
Cada uma melhor que a anterior.
E a mãe, envolvendo-o nos braços,
Amava-o com todo o afecto que se tem para dar.
Aqueles momentos, todos de pendor
Altamente pagão, justificam as suas vidas.
Um dia, o menino colocou-lhe uma questão.
“Mãe, porque é que raramente acendemos luzes?”
Ela colocou-lhe água sobre as feridas
Que tinha no rosto, devido a qualquer confusão
E começou, então, calmamente, dizendo:
“Há muito tempo, quando a Deusa era adorada
E as pessoas carregavam flores nos regaços,
Não existia este desperdício tremendo
Daquilo que a natureza nos dá. Louvada,
A Terra dava aos homens o necessário
Para que eles pudessem sobreviver.
E, nesses tempos, as únicas luzes
Que eles conheciam eram as do temerário
Fogo. Jamais o deixavam morrer
E a Deusa jamais permitiu que deixasse
De os aquecer e iluminar. E assim nasciam,
Viviam, eram felizes e morriam, sempre belos.
E se algum deles, por ventura, imaginasse
Que, no futuro, as lâmpadas existiriam,
Seria considerado louco, decerto!”
Sobre as palavras da mãe ele ponderou
Durante algum tempo, calado.
Mas, de novo, ele a questionou:
“O povo da Deusa adorava-a a céu aberto,
Não era? Mas, se tanto a amavam
Porque nunca nenhum templo lhe foi construído?
Ela colocou-lhe água sobre os cabelos
Louros e arruivados que brilhavam
À luz da vela. “Porque, meu querido,
São um só, a Deusa e a Natureza.
E o seu povo vivia em casas de madeira,
Cobertas com colmo, sobre o relvado
Que ela criara com delicadeza,
Assim como criou a terra inteira.
Por isso, se ela é toda a Natureza,
O seu povo deve idolatrá-la no exterior
Que é, afinal, o seu reino. Assim,
As suas gentes podiam usufruir da beleza
Que ela lhes dera com todo o amor.
E é por isso que não gosto de electricidade.
Porque a Deusa criou o Sol e a Lua
Para nos iluminarem neste mundo escuro.
E não podemos deixar que esta atrocidade
Arrebate as nossas vidas e as polua.
E é por isso que no campo vivemos.
Porque as estrelas ajudam a dar a luz
Que a Lua – e eu não a censuro –
Não pode dar sozinha. Porque podemos,
Observar as figuras que cada estrela produz.
E é por isso que na barulhenta cidade
Não se vêm tantas estrelas como aqui.
Porque a Deusa quer que, como um delfim,
Eu e tu e todas as pessoas vejam a beldade
Que ela criou e usufruamos dela, daqui,
Do campo, da Terra, da Natureza.
Quer seja no poderoso mar,
Ou nas majestosas montanhas,
Ou em qualquer lado onde a sua pureza
Se possa livremente observar.”
O menino acariciou a água fria
Com as suas pequenas mãos claras,
Imaginando o maravilhoso povo antigo,
Cujos ensinamentos a mãe seguia
E que já ouvira dizer serem bárbaras.
Mas a ele, nada disso interessava.
E ele imaginava-os de novo
E imaginava a Deusa e suas façanhas
E ficava embevecido e amava
A sua imagem e a do seu povo.
E a mãe colocava-lhe água sobre os braços,
Arrepiando-o agradavelmente. E ele abraçava-a
E sabia que seria sempre seu amigo.
E na cara dela, via da Deusa os traços
Divinos e imaginava-a na floresta e amava-a.